Na comunidade de Taboão, no município de Espera Feliz-MG, vivem Oscar Gomes de Freitas e Ereni Vilete, carinhosamente conhecidos por Sr. Fizin Bié e Dona Ni, uma família que mantêm uma tradição centenária viva e ensinam para seus filhos e netos.
Na Semana Santa de 2021, há exatamente um ano atrás, Sinthia Oliveira e Roberta Cardoso - técnicas do Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata - realizaram uma visita na propriedade do casal para conhecer a tradição, juntamente com Eliane Pereira e Sebastião Estevão, mais conhecido como Sebastião Farinhada - militante do movimento negro, do movimento agroecológico e das questões relacionadas aos povos tradicionais quilombolas. Essa visita teve o intuito de fortalecer as experiências do Polo Agroecológico e de Produção Orgânica da Zona da Mata, dando visibilidade e valorizando tradições populares que mantêm viva as culturas nas comunidades da região.
Essa herança cultural, que está na família há pelo menos seis gerações, consiste em preparar um remédio toda sexta-feira santa (ou sexta-feira da paixão): um chá com diversas plantas medicinais, sal e algumas frutas, que logo após é dado para os animais da propriedade consumirem, com a intenção de prevenir doenças e manter uma boa saúde.
“É uma tradição que aprendi com meu avô, desde os 7 anos que eu o ajudo na preparação. De lá até hoje, nunca falhei uma sexta-feira santa sem preparar o chá para os animais. Já se completam 84 anos de tradição viva.” Conta o Sr. Fizim, com muita satisfação em manter vivo os ensinamentos do avô.
Processo de preparo do chá
O preparo do chá começa na quinta-feira santa com a colheita de algumas folhas de ervas medicinais pela propriedade. No dia seguinte, Sr. Fizin levanta às 4 horas da manhã para reunir outras folhas e frutas, coloca todas elas no tacho e, logo após o dia amanhecer, acende o fogo e adiciona 2 kg de sal. O cozimento/preparo do remédio dura cerca de 1 hora e 30 minutos e é feito com os seguintes ingredientes: gervão, carqueja, arnica, assa-peixe, folha de laranja, folha de mexerica, fel da terra, fumo bravo, limão (fruto) e 2kg de sal.
Durante o preparo do chá, Sr. Fizin e Dona Ni destacaram a importância do movimento agroecológico como uma potente ferramenta para manter viva a história do povo e também produzir alimentos de verdade, livres de agrotóxicos. Para ambos, o segredo para viver uma vida longa e saudável é ter uma boa alimentação e manter uma relação harmoniosa entre plantas, animais e seres humanos: “Terra tem que ter mato, tem que ter vida”, completou Sr. Fizin. Além disso, na semana que antecede a sexta-feira santa, eles têm a tradição de fazer as rezas - que é quando toda a comunidade se junta!
“Além de preservar a cultura e os valores que foram repassados pela família, eles também conseguem fazer essa conexão com o presente e com o futuro. Através do envolvimento de toda a família, os filhos e o netinho participando. É um ato que devemos respeitar. A gente tem que valorizar porque faz parte da agroecologia! ”, coloca Eliane Pereira e Sebastião Farinhada, parceiros do CTA-ZM e amigos da família. Por fim, o encerramento no domingo de páscoa conta com uma grande celebração na casa da família e uma saborosa mesa da partilha.
Para finalizar, o Sr. Fizin compartilha a satisfação que é ter a companhia do seu neto Suyan, de 12 anos, acompanhando e ajudando durante todo o processo. Sr. Fizin tem 91 anos, Dona Ni 87 e juntos tiveram 9 filhos e 8 netos. Desde sempre praticam a agricultura familiar sustentável como modo de vida e em sua propriedade é possível encontrar uma produção diversa. Uma forma de manter sempre viva suas origens e poder compartilhar com as próximas gerações.
Fonte: CTA Zona da Mata
Autor: Sinthia Oliveira e Roberta Cardoso; Edição: Michele Sotero